quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

RELATÓRIO :DOS FIOS DE CABELO A PONTA DOS PÉS

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO-OESTE - UNICENTRO

CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE GUARAPUAVA

DEPARTAMENTO DE ARTE-EDUCAÇÃO

R. PE. SALVATORE HENNA, 875 - FONE: (042) 3621-1000 – FAX: (042)3622- 8644 – 85015-430 GUARAPUAVA PR.

1. IDENTIFICAÇÃO:

BOLSITAS: Graciana I. dos Santos e Luciana dos Santos.

ESCOLA: Colégio Estadual Ana Vanda

TURMA: 3°A TURNO: Manhã

Este relatório tem por objetivo analisar os resultados obtidos no desenvolvimento de duas oficinas que fazem parte do PIBID- Programa Institucional de Bolsas de Iniciação a Docência o qual foi dividido em etapas: de observação, de auxílio nas aulas de Arte, e por fim de regência tendo a orientação da professora supervisora. Anteriormente, à execução das oficinas foram aplicados questionários aos alunos sobre a Arte, seus conteúdos e seus desejos em assuntos específicos, os quais demonstraram maior interesse pela área de musica.

No primeiro semestre a oficina “Dos fios de cabelo a ponta dos pés”, oficina esta de Arte e tecnologia com ênfase na música, desenvolveu-se com alunos do ensino fundamental do Colégio Estadual Manoel Ribas, em contra-turno com carga horária de 24 horas. No segundo semestre tendo em vista a evasão na oficina anterior, reavaliamos o planejamento executado e adaptamos a oficina para o novo público, no Colégio Estadual Ana Vanda Bassara no período de outubro a dezembro de 2011, sendo direcionada ao 3°ano do ensino médio com a participação de 38 alunos e cronograma de 26 aulas na disciplina de Arte, vivenciando outra realidade.

A oficina desenvolveu-se como pesquisa participante[1], a qual foi proposta em três módulos, sendo que o primeiro tratou mais especificamente da música, sua sensibilização, seus campos sonoros, seus materiais e sua manipulação através da tecnologia, o segundo módulo relacionado à dança, da mesma forma sua sensibilização, a investigação corporal e a produção de vídeos-dança, e por último a integração e dissociação dos aspectos sonoros e corporais a fim de compor música para dança criada e dança para a música composta.

Desta forma proporcionando aos educandos novos conhecimentos e práticas musicais e corporais com o uso da tecnologia.

No módulo de música introduziu-se o conceito de paisagem sonora, e após foi proposto uma escuta[2] dos sons no ambiente escolar a fim de que os alunos descrevessem e criassem símbolos para os sons que identificaram, como parte do processo avaliativo. Muitos alunos tiveram um olhar diferenciado do mesmo após a prática de percepção sonora e de escuta mais atenta do lugar onde estão inseridos.

O termo paisagem sonora foi criado pelo compositor canadense Murray Schafer em 1960, este conceito é bastante demonstrado no filme “O som do coração”[3] o qual os alunos assistiram para ampliação do seu repertório e a possibilidade de uma escuta mais cuidadosa e crítica do seu meio.

Os sons das máquinas cada vez mais presentes no cotidiano, houve uma transformação significativa na sonoridade dos espaços, principalmente na zona urbana. Ao pesquisar a sonoridade relacionando-a com aspectos do ambiente, M. Schafer teve de criar uma terminologia particular para abordar os fenômenos que estudava. O conceito mais significativo que formulou foi soundscape, traduzido para o português como paisagem sonora. Murray Schafer define soundscape como todo e qualquer evento acústico que compõe um determinado ambiente(...). Parece-me absolutamente essencial que comecemos a ouvir mais cuidadosamente e criticamente a nova paisagem sonora do mundo moderno”. (OBICI, 2006,p.29)

Na seqüência trabalhamos a criação de partituras tendo como foco os sons experimentados por eles. Foram divididos em três grupos, um deles ficou com sons do corpo, o outro com sons produzidos pela voz e o outro com sons dos objetos, mobília da sala. Após a criação das partituras cada grupo apresentou para toda turma e depois elas foram colocadas no quadro negro para que cada um pudesse ser regente dos demais colegas da sala.

Em seguida a ampliação da escuta sonora, passamos para uma nova etapa mais significativa para o nosso projeto que estava totalmente ligado a tecnologia, no qual utilizamos um software de manipulação de áudio Audacity[4] para uma composição musical de uma paisagem sonora. Os educandos foram divididos em trios os quais escolheram o local onde deveriam gravar os sons pela manhã, tarde e noite, e posteriormente manipular e produzir esta composição. Conforme afirma Schafer “O que me interessa realmente é que os jovens façam a sua própria música, seguindo suas inclinações, conforme acharem melhor”.(1991, p.296)

Outro tema abordado foi sobre os aparelhos corporais que compõem a produção sonora, exercícios de técnica vocal, aquecimento das pregas vocais. Esta prática foi bem interessante onde todos participaram simultaneamente, em seguida trabalharam em grupos menores com trava- línguas, o que gerou resultados criativos apesar da timidez aparente durante as apresentações.

Devido à resistência apresentada pelos alunos quanto a exposição frente a turma, o que freqüentemente acontecia, além de conteúdos parcialmente novo, tivemos que fazer uma pausa no cronograma da oficina para uma revisão teórica a pedido da professora regente. E após aplicamos uma prova, na qual formulamos 10 questões relacionadas à Arte e tecnologia, programa Audacity, Paisagem sonora e Técnica vocal com o auxílio da professora regente.

Na aula posterior fizemos a recuperação da nota integral do bimestre, buscamos textos[5] para embasar o assunto de Arte e tecnologia colocando ao final dos textos questões para reflexão, onde cada aluno teria que oralmente explicar uma questão de forma reflexiva e crítica.

Iniciando o segundo módulo respectivo à dança explicamos sucintamente sobre a história da dança desde o período clássico até o contemporâneo e também sobre as principais características relacionadas ao dançarino, figurino, movimentações, expressões e interpretação. Para esta etapa nos fundamentamos em Isadora Duncan, Martha Graham, Merce Cunningham e Isabel Marques. Os educandos apresentaram bastante resistência a qualquer tipo de expressão corporal ao relatar experiências anteriores que lhe desagradaram e constrangeram. Em seguida foram apresentados vídeos de dança contemporânea dos grupos DV8, Grupo Corpo e Cia Débora Colker e outros, discutimos os elementos específicos presentes nesta forma de expressão, seguindo com uma breve introdução dos elementos formais da dança segundo Laban: níveis, espaço, fluência, tempo, entendendo que esses conteúdos são básicos para o ensino desta manifestação na escola.

A escola pode, sim, dar parâmetros para sistematização e apropriação crítica, consciente e transformadora dos conteúdos específicos da dança e, portanto, da sociedade. A escola teria, assim, o papel não de reproduzir, mas de instrumentalizar e de construir conhecimento em/através da dança com seus alunos(as), pois ela é forma de conhecimento, elemento essencial para a educação do ser social. (MARQUES, 1997,p.23)

A dança tem seus conteúdos específicos e não deve ser usada com propósito de desenvolver outras atividades, mas sim de promover momentos de criação onde os benefícios não precisem ser negados, porém deve-se ensinar a dança como uma forma de conhecimento e desenvolvimento de expressão corporal. Ela possibilita uma maneira de expressar-se através de gestos, onde cada sujeito particularmente manifesta suas poéticas pessoais ou coletivas. Cada indivíduo possui uma relação única com o mundo, porém existem algumas concepções que são construídas pela sociedade, e mesmo a subjetividade tem interferência do meio, por fim, somos uma construção de várias intervenções que temos contato durante nossa existência.

Inspirado sobretudo em Foucault, Deleuze e Guattari, Hardt afirma que a subjetividade não é dada a priori, porém se constitui no campo das forças sociais. As práticas sociais cotidianas estabelecem a forma com que lidamos com o mundo. As instituições sociais estão no interior, dentro de nós. Então, não se deve considerar a subjetividade como dada e sim como um processo de produção. Cada instituição tem sua própria lógica de funcionamento e subjetivação. Hardt diz que, mais do que nunca, as subjetividades estão sendo produzidas intensamente e é este tipo de produção, e não a oposição à sociedade disciplinadora, que define a passagem a uma sociedade de controle. Segundo ele, a lógica interior das instituições, na Atualidade, estendem-se a todo campo social. Portanto, não podemos delimitar a produção da subjetividade a lugares específicos. (LESSA, 2005, p.42-43)

Parafraseando Siqueira e Siqueira, (2006, p.99) “[...]com a dança contemporânea, elementos do balé, de dança moderna, do teatro, da performance e de outras formas de movimentação humanas, incluindo lutas e técnicas circenses, se mesclam. Assim, o passado não é deixado de lado, muito ao contrário, é recontado a cada momento de acordo com as mudanças daqueles que vivem no presente.”

E, é na apropriação de técnicas e saberes diversos que nossos alunos podem criar seus movimentos, compondo coreografias, e se valendo da tecnologia quando assim desejado para ampliar seu repertório, ou simplesmente por escolhas em seu processo criativo.

Ao finalizar este módulo ficamos satisfeitas, pois os alunos romperam com a resistência que tinham e fizeram a proposta de dança. A turma foi dividida em cinco grupos e cada um trouxe um movimento do cotidiano e apresentou para os seus colegas e a partir da desconstrução deste movimento e a união de todos os movimentos do grupo eles compuseram uma célula coreográfica acrescentando pelo menos uma das características da dança contemporânea.

O terceiro módulo que se tratava da integração e dissociação dos aspectos sonoros e corporais a fim de compor música para dança criada e uma dança para a música composta, não foi aplicado devido à falta de tempo hábil para execução do mesmo, pelo fato da nossa oficina ter sido ofertada no final do ano, tivemos que encerrar na data prevista pelo calendário escolar.

Vivenciamos a realidade em sala de maneira mais efetiva nessa fase do projeto, pois muitos foram os enfrentamentos que aconteceram, como a resistência à tecnologia enquanto ferramenta para criação artística, a falta de recursos tecnológicos por parte da escola, a qual não possuía o programa de manipulação de áudio instalados nos seus computadores e também não tivemos como instalá-lo porque o sistema não aceitava. Devido a isto foi pedido aos alunos que possuem Notebook que trouxessem para que pudéssemos dar andamento ao planejamento da oficina. Contudo, isto gerou novos transtornos, pois muitas foram as reclamações dos alunos, entre elas: “não estudamos em colégio particular pra ter um notebook, somos pobres”,desculpa essa que dois alunos usaram por falta de vontade de realizar as atividades pois tinham computadores a disposição deles e mesmo assim não fizeram. Também reclamaram que estavam tendo aulas de informática e não de Arte, além de alegarem que por esses motivos não tiveram contato suficiente com o programa e foram prejudicados, entretanto, já havíamos feito uma explicação anterior em data show alem do auxilio constante e de forma individual nas duvidas apresentadas por eles durante o desenvolvimento das atividades.

Pelo fato, de termos que seguir um cronograma escolar foi exigido que aplicássemos prova e recuperação, isso gerou aumento de conteúdo, atraso na execução da oficina e por isso não pudemos concluir o planejamento de todas as aulas.

O calendário escolar foi outro obstáculo enfrentado devido a muitos feriados, dispensas por parte da equipe pedagógica, viagens, reuniões de professores, entre outros fatores.

Outro fator foi o conceito pré-estabelecido dos alunos sobre a Arte, de que só é Arte aquilo que vem do tradicional, e não aceitavam a Arte Contemporânea como legítima, por isso tivemos que desconstruir e reformular conceitos a fim de proporcionar outros olhares e saberes reflexivos a este respeito. Por isso concordamos com Isabel Marques (1996, p. 20 ) ao falar sobre este assunto:

É nesta perspectiva da diversidade e da multiplicidade de propostas e ações que caracterizam o mundo contemporâneo que seria interessante lançarmos

um olhar mais crítico sobre o ensino da dança na escola. A transmissão de conhecimento hoje, como sabemos, não se restringe mais às suas quatro paredes. (...).Indo mais além, não podemos nos esquecer de que "as exigências da sociedade tecnológica - em permanente transformação - obrigam a um novo posicionamento sobre o sentido do que é educação, formação, ensino e aprendizagem.

Micheliny Verunchk cita Ana Mae Barbosa que muito contribui ao nosso posicionamento frente à Arte Contemporânea e seu ensino:

Não dá para resumir a arte contemporânea numa só característica, pois pluralidade domina nosso tempo. Assim, podemos apreendê-la pela seguinte série de qualidades: - consciência da morte da autonomia da obra ou do campo de sentido da arte em prol da contextualização. - metalinguagem: reflexão sobre a própria arte. - incorporação de matrizes populares na arte erudita. - preocupação em instaurar um diálogo com o público e levá-lo a pensar. - tendência ao comentário social. - 'interritorialidade' das diversas linguagens. - tecnologias digitais substituindo a vanguarda. (VERUNCHK apud BARBOSA 2009, p.1)

Foi nessa fase das atividades que pudemos vivenciar de maneira mais significativa o objetivo principal do projeto de formação docente, pois experimentamos a realidade como ela é, com todas as suas surpresas positivas e negativas, que um professor enfrenta em sala de aula, o que nos fez amadurecer como profissionais e repensar constantemente nossas práticas.

Outro fator que gera reflexão é que tínhamos um aluno experiente em edição de vídeos e pudemos também aprender com ele, isso demonstra aos professores que sempre poderão ter em sala um aluno mais conhecedor de um determinado assunto e ser humildes para aprender com ele pois, na atualidade o ensino deve ser baseado na descoberta mutua compartilhando experiências como Schafer (1991, p.322) afirma que o “[...]que estamos fazendo requer flexibilidade, capacidade de adaptação e s1ubstancial dose de energia, por parte do professor.”

Referências:

ANDERÁOS, Ricardo, Webart-Arte e Tecnologia,Disponível: http://www.arteetecnologia.com.br/reportagemnoticia.asp?id=134 acesso em 01fev2012.

CASTLE, Nick; HART James V; SHERIDAN, Kirsten e CASTRO Paul Kirsten Sheridan (Dir) O Som do Coração, Europa Filmes, legendado 113 min/Color

DUARTE, Mariana, O que é dança contemporânea?Disponível em:http://jpn.icicom.up.pt/2008/12/22/o_que_e_a_danca_contemporanea.html acesso em 01fev2012.

LESSA, Evandro de Souza. Corpo e Hibridação na Atualidade Tecnológica Universidade Federal do Rio de Janeiro,2005 Disponível: em http://www.psicologia.ufrj.br/pos_eicos/pos_eicos/arqanexos/arqteses/evandrolessa.pdf acesso em 20dez2011

MARQUES, Isabel A., Dançando na Escola. MOTRIZ. V.3 p.23 N°1, Junho/1997 Disponível em: http://www.rc.unesp.br/ib/efisica/motriz/03n1/artigo3.pdf acesso em 29out2011

MONTE, Fernanda, Guidarini, NASCIMENTO, Juarez, Reflexões sobre as mudanças no contexto histórico da dança do século XX e a dança na atualidade, Disponível em: http://www.efdeportes.com/efd127/mudancas-no-contexto-historico-da-danca-do-seculo-xx.htm acessado dia 01fev2012

OBICI, Giuliano, Condição da Escuta mídias e territórios sonoros PUC São Paulo Disponível em :http://www4.pucsp.br/nucleodesubjetividade/Textos/giuliano/condicaoescutagiuliano.pdf Acesso em 29out2011

SCHAFER, R. Murray. O ouvido pensante. Tradução: Marisa Trench de O. Fonterrada; Magda R. Gomes da Silva; Maria Lúcia Pascoal. São Paulo: Fundação Editora UNESP, 1991

VERUNCHK, Micheliny, Afinal o que é Arte Contemporânea? Revista continuum Enquete Mar/Abr, 2009. Disponível em : http://www.itaucultural.org.br/index.cfm?cd_pagina=2720&cd_materia=859 Acesso dia 01fev2012.



[1] A pesquisa caracteriza-se como participante, pois ocorreu a partir da interação entre pesquisadores e os indivíduos das situações pesquisadas.

[2] Escutar é dar significado ao que se ouve.”Escutar” estaria mais próximo da dimensão interpretativa da percepção que corresponde á categoria da terceridade.

[3] CASTLE, Nick; HART James V; SHERIDAN, Kirsten e CASTRO Paul Kirsten Sheridan (Dir) O Som do Coração, Europa Filmes, legendado 113 min/Color

[4]Sofware gratuito de manipulação de audio. Disponível em: http://audacity.sourceforge.net/

3 comentários:

  1. É meninas, esta proposta ainda tem muito o que se explorar. Nos aproximamos mais da música e dança mas sabemos que existem tantas outras possibilidades. E que este projeto instigue-nos a procurar novas metodologias.

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  2. muito interessante Kelly o teu olhar pois como desmembramos no segundo semestre esses questionamentos e apontamentos são de fundamental importância

    LU

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  3. Fazendo mais leituras encontrei iniciativas que trabalham com manipulação de imagens e com o cinema.. quem sabe para trabalhos posteriores possamos explorar um pouco mais este universo. Até porque tivemos oficinas durante nossa formação e conseguimos explorar algumas metodologias. Seria um bom ponto de partida para uma próxima investigação :)

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