A formação docente para o ensino da Arte, incluindo a música, é uma questão urgente no sistema educacional brasileiro. A escassez de profissionais com formação em licenciatura nesta área revela que há na escola muitos professores sem formação em arte ministrando esta disciplina, como também, uma valorização de práticas relativas às artes visuais, comprometendo, em detrimento as práticas de dança, teatro e música. A formação em Arte-Educação, objetiva formar o profissional para o ensino da arte, em suas especificidades, para a educação básica, portanto nesta formação tanto o conhecimento artístico e cultural quanto o conhecimento didático e metodológico são de igual e extrema importância.
Diante disto, as ações desenvolvidas pelo PIBID Arte envolvem o fazer docente em arte em seus aspectos teórico e metodológico. Tanto a inserção dos acadêmicos no ambiente escolar quanto à investigação sobre o ensino de arte na escola, permitem a reflexão crítica sobre a prática docente. Dentro e fora da sala de aula, o professor é levado à repensar sobre os ranços educacionais, a analisando sua ação discente e a experimentação diante de adaptações de metodologias utilizadas. Desta maneira, é possível pensar em uma formação para a práxis educacional, juntando o ambiente escolar, alunos e universidade, proporcionando pesquisas significativas nestas áreas de ensino.
O PIBID Arte ofereceu quatro oficinas nas escolas associadas, Ana Vanda Bassara e Manoel Ribas. A oficina que aqui se relata é intitulada como “Hip Hop: O Rap invade a cena”, e o break foi a prática inicial da oficina no Colégio Estadual Ana Vanda Bassara, no segundo semestre do ano de 2011.
O público alvo foi alunos da rede pública de Guarapuava/PR, mais especificamente, alunos do terceiro ano do ensino médio, totalizando uma freqüência de 38 alunos e alunas, desde nove á trinta de setembro de 2011, objetivando o contato prévio sobre a cultura Hip Hop, seus elementos, seu contexto social e a integração entre as linguagens artísticas. Abordando conteúdos musicais por meio de composições e apreciações de Rap’s, desenvolvendo e incentivando, a partir das diferenças o respeito ao próximo e sua realidade social.
Começamos com o elemento break, pois percebemos que ao se falar sobre Hip Hop, a maioria das pessoas associam o movimento e a cultura a um único elemento: a dança.
Optamos por trazer toda a contextualização histórica e social do movimento, suas origens, vertentes e situação atual do Hip Hop no Brasil.
Assim, o break é uma dança expressiva e complexa de ser simplesmente explicada, e, mesmo sendo introduzida, pede-se uma prática de experimentação corporal. Portanto, resolvemos trabalhar os movimentos característicos do break através de adaptações de jogos de espelho e jogos teatrais ritmados, com batidas compostas por Dj’s do Hip Hop, desenvolvendo uma prática dinâmica e de interação entre os alunos.
Nossa maneira de trabalhar, inicialmente, não foi respeitada pelos alunos, eles se negavam a nos ouvir e diziam que não iriam participar, pois não gostavam de dançar. No decorrer das experimentações, os alunos se permitiram participar, tínhamos então uma turma trabalhando unida, se divertindo, “dançando” e, o mais importante, aprendendo e ampliando repertório cultural, muitas vezes, podado por questões de pré-conceitos.
Toda essa prática levou, aproximadamente, três aulas para acontecer, como era necessária uma avaliação pedagógica, pedimos para que os alunos se dividissem em grupos e nos apresentassem uma pequena célula de movimentos do break. Essa prática aconteceu, no entanto, com alguns atrasos por parte dos alunos, um único aluno apresentou o trabalho na data estipulada, os outros apresentaram nas próximas aulas, conseqüentemente, tivemos que adaptar nosso cronograma, adiando o período e as datas de apresentações.
O segundo elemento a ser apresentado para os alunos foi o Dj, além de repassar o conteúdo do movimento Hip Hop, falamos das funções e do desenvolvimento de seu trabalho, mostramos as transformações dos toca-discos e as possibilidades de mixagens e modificações sonoras. A universidade possui esse tipo de equipamento, então levamos os toca-discos para o ambiente escolar, para que pudessem vivenciar e manusear este tipo de equipamento tão peculiar e cheio de funções.
Alguns alunos ficaram receosos de participar da proposta e danificar o equipamento, outros gostaram tanto, que não queriam sair, experimentavam todos os botões e possibilidades de risco nos discos.
A seguir, viria o Grafitti, uma arte urbana, que questiona e invade o campo de visão do indivíduo sem pedir licença. Mostramos inúmeras imagens na TV Pendrive e conversamos a respeito de cada uma delas.
Percebemos que a turma era bastante visual e que trabalhar o grafitti era algo prazeroso. Ao contextualizar as obras e os artistas, comentamos da necessidade de informação de quem a faz, da não banalização e do sentido que ela ganha na sociedade. Pedimos aos alunos que produzissem um grafitti em uma folha com o tema que quisessem, relacionando a partir do desenho questões realmente importantes para cada um deles.
Apesar da proposta ter sido explicada, tivemos alguns desenhos sem princípio de grafitti, meras cópias e impressões da internet. Por outro lado, muitos desenhos se mostraram dentro da proposta, com significados muito fortes, que, valem a pena serem destacados. Ao final deste relatório, confira em anexo as imagens citadas.
A seguir, o Rap, como o próprio título da oficina sugere, iria invadir a cena e o cotidiano dos alunos, este era o nosso foco principal nas propostas a serem trabalhadas. Questões pertinentes à burocracia escolar fizeram com que adaptássemos nossos conteúdos, deixando o Rap em segundo plano de trabalho, já que devíamos avaliar e recuperar conteúdos e provas para avaliação de notas no bimestre, como de costume.
A turma contemplada pelo projeto era agitada, muito falante e pouco disciplinada, portanto falar de composição, ritmo, métrica e elementos musicais foi um pouco difícil, tentamos de várias maneiras e, a partir do momento em que eles ouviram Rap’s comentários como “Isso não é música” vieram à tona.
Avaliar era preciso, e como mencionado, após contextualizar e ouvir músicas e grupos de Rap’s conversamos e propusemos um trabalho de composição da letra de um Rap. Os alunos eram livres para escolher o tema, desde que fizessem relação com a realidade e identidade do compositor.
Com muita satisfação abaixo cita-se pequenos trechos de algumas dessas composições.
“Sentimentos” é o nome do Rap:
“Estou numa UTI, sem motivos pra sorrir
O cenário muito cruel / Muita vontade de sair
Por aqui só tem motivos pra chorar, recordar enfim,
O desejo vem chegando / Os soluços piorando
A vida que aqui se passa / Está se dominando
Neste momento na nossa mente / Passa tudo / Lembranças e lembranças
Para os corações que sentem e estão cheios de esperança (...)”
O gosto pelo gênero não era de toda a turma, muitos ali não gostavam e não entendiam, no entanto, após serem apresentados ao Hip Hop, mais especificamente ao Rap, e sua real proposta, alguns continuaram não gostando, mas passaram a entender, respeitar e compreender “(...) que essa característica do Rap ser contestatório faz parte do perfil de resistência da música norte-americana, que, desde as work songs e os spirituals, tentam preservar e manifestar sua cultura.” (ANDRADE, 1999 p.55).
“Educação é o que levanta a civilização”:
“(...) Se todo mundo fosse pela educação
Para e pensa que mundão
Agora é a hora de mudar a situação
Educar os cidadãos
(...)”
“Tire a venda dos olhos”:
“Você sabe o que realmente importa
Nem parou pra notar que a sua vida anda torta
Você corre atrás do dinheiro e nem para pra ver que sua saúde vem primeiro
Você fica preocupado se está fora da moda
E não liga para o mendigo que bate a sua porta
(...)
Coloque os olhos da verdade / E em seu peito coloque determinação
Seja ousado que ninguém vai te deter irmão
Reveja seus conceitos / Seja humilde e nunca perca sua educação
Pois Deus te ajuda a conquistar essa nação.”
A última composição citada, relata a real circunstância de duas alunas no Colégio Estadual Ana Vanda Bassara, que estavam em fase de vestibular. As alunas compreenderam que o Rap pode contar uma história que fale do próprio compositor, no caso, a história delas, intitulando a composição de “O sonho de uma vida inteira”:
“Desde criança, eu tenho um sonho
Que pretendo realizar.
Para mim conseguir, tenho que me esforçar.
Minha história de estudante se iniciou em 1999.
Com muita dedicação aprendi a ler e escrever
E assim muita coisa vem a se resolver.
Hoje, passado 11 anos, inicío minha vida de vestibulando
E sei que a cada passo que eu der
Tentarei fazer o melhor que puder.
A Deus agradeço o dom da vida
Da sabedoria, peço a graça de poder
Concluir mais uma etapa da minha vida
Nesse vestibular tentarei Pedagogia
Para poder transmitir o dom da sabedoria
Hoje é um ponto de chegada
E ao mesmo tempo de partida
Para a nova etapa que iniciarei em minha vida.”
Portanto, percebemos que apesar dos contratempos burocráticos da escola, dos conflitos e situação da turma contemplada pelo projeto, tivemos um ambiente de trocas reais de informação, aprendemos em cada proposta aplicada, e, os alunos se transformaram a cada encontro. Discussões, conversas, relações de amizade estiveram presentes em cada uma das aulas, tornando a escola, um ambiente propício a aprendizagem significativa em arte, já que sempre colocamos os alunos e as suas realidades à frente dos conteúdos trabalhados, priorizando o ser humano em toda a sua complexidade.`
REFERÊNCIA
ANDRADE, Elaine Nunes de. Rap e educação, rap é educação. São Paulo: Summus, 1999.
Foi uma experiência gratificante, só tenho a agradecer o projeto.
ResponderExcluirNo relatório pude notar resistência em muitos momentos das propostas mas acredito que faz parte e vcs devem ter resolvido muito bem. Ao final os alunos fizeram composições bem interessantes esse momento da composição foi mais fácil?
ResponderExcluirEste momento de composição dos alunos e alunas é a superação de qualquer problema enfrentado na oficina, pois é alcançar o resultado mais objetivo.. pelo menos na minha opinião... o fazer é o ponto principal no ensino da arte. É onde o saber se corporifica.
Excluirfoi sim Rafa e foi surpreendente... pq náo esperavámos algo tao bom... foi gratificante olhar o resultado do nosso trabalho durante as práticas.
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