Educação ---- Para quê?
Trata-se de um artigo escrito em conseqüência do diálogo entre Adorno e Becker, referente ao assunto: para onde a educação deve conduzir? A primeira questão se dá em relação à falta de evidência do para que educar. Ao levantar este problema na discussão percebe-se a necessidade de reflexões complicadas acerca do assunto.
Inicia-se, então, uma discussão em relação aos modelos ideais de educação. Ambos os autores concordam em questionar o conceito de modelo ideal.
“Eu diria que atualmente a educação tem muito mais a declarar acerca do comportamento no mundo do que intermediar para nós alguns modelos ideais preestabelecidos. Pois se não fosse por outro motivo, a simples e acelerada mudança da situação social bastaria para exigir dos indivíduos qualidades que podem ser designadas como capacitação à flexibilidade, ao comportamento emancipado e crítico.” (ADORNO, 1995, p.141)
Entende-se, a partir de então, que um modelo de educação ideal entra em contradição com a idéia de homem autônomo. Adorno apresenta sua concepção de educação como sendo a produção de uma consciência verdadeira.
A seguir, e assumindo o risco, gostaria de apresentar a minha concepção inicial de educação. Evidentemente não a assim chamada modelagem de pessoas, porque não temos o direito de modelar pessoas a partir do seu exterior, mas também não a mera transmissão de conhecimentos, cuja característica de coisa morta já foi mais do que destacada, mas a produção de uma consciência verdadeira.” (ADORNO, 1995, p.141)
Segundo os autores o objetivo não é moldar o caráter do indivíduo, nem tornar a transformação emancipatória num modelo ideal, isto seria contraditório, visto que esta transformação é dialética e não pode ser pré-definida, é um processo e cada processo possui suas peculiaridades. A proposta é conscientizar para a autonomia, a fim de que o indivíduo seja capaz de fazer uso do seu próprio entendimento sem o auxilio de outrem. “A idéia da emancipação, como parece inevitável com conceitos deste tipo, é ela própria ainda demasiado abstrata, além de encontrar-se a uma dialética. Esta precisa ser inserida no pensamento e também na prática educacional.”(ADORNO,1995, p.143).
Porém, conforme nos apresenta Adorno, há dois problemas que precisão ser avaliados quando se refere a emancipação: o primeiro seria a própria organização do mundo e o segundo a ideologia dominante. Estas duas questões são apresentadas como opressores, e acabam se tornando uma só, visto que, “a organização do mundo converteu-se a si mesma imediatamente em sua própria ideologia.”(ADORNO, 1995, p.143). Quanto a isso, relativo a educação, o autor afirma que:
“A educação seria impotente e ideológica se ignorasse o objetivo de adaptação e não preparasse os homens para se orientarem no mundo. Porém ela seria igualmente questionável se ficasse nisto, produzindo nada além de well adjusted people, pessoas bem ajustadas, em conseqüência do que a situação existente se impõe precisamente no que tem de pior. (ADORNO, 1995, p. 143)”
Adorno, na citação anterior, apresenta dois momentos a respeito do conceito de emancipação. Primeiramente o de adaptação, necessário para saber se orientar no mundo. O segundo diz respeito a autonomia do indivíduo, o esclarecimento sobre as coisas e a competência de escolha consciente sem perda da individualidade. O autor supõe que o processo de adaptação, segundo ele outra hora automático, agora acontece de maneira forçada.
“Pelo fato de o processo de adaptação ser tão desmensuradamente forçado por todo o contexto em que os homens vivem, eles precisam impor a adaptação a si mesmos de um modo dolorido, exagerando o realismo em relação a si mesmo, e, nos termos de Freud, identificando-se ao agressor.” (ADORNO, 1995, p.144).
Dentro desta perspectiva, o autor afirma ser mais necessário a ação da educação em esclarecer acerca da autonomia do indivíduo em relação ao mundo em que este vive do que falar sobre sua adaptação no mundo.
“A importância da educação em relação à realidade muda historicamente. Mas se ocorre o que eu assinalei há pouco --- que a realidade se tornou tão poderosa que se impõe desde o inicio aos homens ---, de forma que este processo de adaptação seria realizado hoje de um modo antes automático. A educação por meio da família, na medida em que é consciente, por meio da escola, da universidade teria neste momento de conformismo onipresente muito mais a tarefa de fortalecer a resistência do que de fortalecer a adaptação.” (ADORNO, 1995, p144)
Percebe-se, nas palavras do filósofo, uma preocupação em relação a perda da individualidade, por isso indica, em relação a postura educacional, maior ênfase na resistência, visto que esta adaptação forçada, citada pelo autor, reprime e inibe qualidades pessoais. Na seqüência é levantada a seguinte discussão, sendo a emancipação um termo relacionado à teoria e a prática, deveria ela então ser trabalhado desde a infância até o fim da vida.
“Parece-me que a tarefa de intermediar uma consciência da realidade, uma tarefa intimamente vinculada à relação entre teoria e prática, não pode por assim dizer ser tratada em nível universitário, mas precisa ser realizada a partir da primeira educação infantil mediante uma educação permanente durante toda a vida.” (ADORNO, 1995, p.146).
Esta perspectiva do autor, de esclarecimento contínuo, durante a existência humana, se apresenta como característica dialética. Pois está em constante processo de transformação. “O que estamos discutindo aqui não pode ser relacionado ao colégio ou à universidade a partir de formulas consagradas, mas sim ao conjunto da estrutura educacional, da pré-school-education até a formação para idosos.” (ADORNO, 1995, p.151). Vindo a tona a definição de educação do pedagogo polonês Bogdan Suchodolski, citado no texto: “...definiu a educação como’ preparação para a superação permanente da alienação’”. (ADORNO, 1995, p.150).
Continuando, o assunto abordado no dialogo levanta questões acerca da conscientização e daquilo que é criativo, ou, espontaneidade. O primeiro termo se refere ao conhecimento teórico e histórico, necessário para se orientar no mundo. O segundo faz menção acerca da disponibilidade a experiências diferenciadas, visando a reflexão. Segundo o autor há pessoas que resistem à educação. “Elas querem se desvencilhar da consciência e do peso de experiências primárias, porque isto só dificulta sua orientação.” (ADORNO, 1995, p.149). Adorno também acrescenta:
“Essas pessoas odeiam o que é diferenciado, o que não é moldado, porque são excluídos do mesmo e porque, se o aceitassem, isto dificultaria sua “orientação existencial”, como diria Karl Jaspers. Por isto, rangendo dentes, elas como que escolhem contra si mesmas aquilo que não é propriamente sua vontade. A constituição da aptidão à experiência consistiria essencialmente na conscientização e, desta forma, na dissolução desses mecanismos de repressão e dessas formações reativas que deformam nas próprias pessoas sua aptidão à experiência. Não se trata, portanto, apenas da ausência de formação, mas da hostilidade frente à mesma, do rancor frente àquilo de que são privadas.” (ADORNO, 1995, p.150).
Deste modo, Adorno apresenta a necessidade de uma transformação emancipadora. Visto a necessidade de uma consciência verdadeira, a qual o autor caracteriza como:
“Mas aquilo que caracteriza propriamente a consciência é o pensar em relação à realidade, ao conteúdo --- a relação entre as formas e estruturas de pensamento do sujeito e aquilo que este não é. Este sentido de mais profundo de consciência ou faculdade de pensar não é apenas o desenvolvimento lógico formal, mas ele corresponde literalmente à capacidade de fazer experiências. Eu diria que pensar é o mesmo que fazer experiências intelectuais. Nesta medida e nos termos que procuramos expor, a educação para a experiência é idêntica à educação para a emancipação.” (ADORNO, 1995, p.151)
Deste modo, conforme o dialogo, a consciência seria a capacidade de se permitir relacionar e refletir sobre aquilo que lhe é diferente. Para concluir o dialogo, nas palavras de Adorno, “A única possibilidade que existe é tornar tudo isso consciente na educação” (ADORNO, 1995, p.154).
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Obs. Desculpe a demora pessoal, espero que gostem!
Fica na Paz!
Julio Cezar